Por João Alegria*
A cidadania no século XXI requer um nível de conhecimento que poucas pessoas alcançaram: saber ler e entender os produtos da mídia, como os sites e as redes sociais, o cinema e a televisão, os jogos eletrônicos e os robôs de mensageria. Isso envolve capacidades que vão muito além do que foi considerado alfabetização na era de Gutenberg, quando os cidadãos se contentavam com livros, jornais e revistas. Isso já não basta. A alfabetização em mídia é fundamental na construção de identidades, na formação da consciência sobre o estar no mundo e para nossa capacidade de ação social.
Perceba que o suporte daquilo que se lê vem mudando através dos tempos, já foi uma parede de pedra na caverna onde viviam nossos antepassados, hoje é um e-paper. O suporte muda, mas a linguagem sobrevive e se renova, com sua capacidade narrativa e condutora do pensamento.
A escrita e a leitura, tomadas de forma isolada, são apenas uma tecnologia de comunicação, similar a muitas outras. Ou seja: conseguimos emitir e decifrar mensagens através do uso de sinais gráficos, que chamamos de letras, que podem ser organizados em conjuntos para formar as palavras, que nós usamos para montar frases e textos mais longos. Mas escrita e leitura só podem acontecer num contexto social e cultural específico e é assim que os textos ganham sentido, intenção, estilo… e passam a constituir uma linguagem.
O processo de alfabetização não se resume a preparar crianças e jovens para identificar letras e ler palavras e frases. Ele também deve formar competências que levam à compreensão de sentido daquilo que foi dito, e também do que não foi dito; ainda mais além, a identificação das intenções e idéias por trás da mensagem; dos conceitos abstratos, expressos nas diferentes formas de texto que se propagam em nossa sociedade e cultura.
Veja-se o caso da imagem, por exemplo. Há uma quantidade enorme de imagens em circulação e todos crêem ser capazes de ler imagens sem o mínimo de estudo prévio, mas não é bem assim. Uma fotografia, representando objetos e fenômenos pertencentes a uma outra cultura, é quase tão incompreensível quanto um texto escrito em uma língua que a gente nunca viu. Como diz o Ivan Lima, não existe uma fotografia sequer que possa ser percebida da mesma forma por um brasileiro, um francês e um chinês, por uma moça de 18 anos e um homem de 80. Uma imagem, um audiovisual, uma página da internet, uma pintura, um texto escrito, todos esses produtos culturais podem ser lidos, mas sem ter sido alfabetizado nas suas diferentes linguagens não dá para compreender quase nada do que está contido ali.
Daí a necessidade de pensar um processo de alfabetização mais abrangente, para além da escrita e da leitura de texto, envolvendo todos os produtos e linguagens da mídia. A alfabetização, assim compreendida, é um processo sócio-cultural muito amplo, que envolve competências de comunicação em diversas linguagens (textual, visual, audiovisual, corporal etc.). O mundo é uma confusão de mensagens, e para decifrar esse caleidoscópio é que precisamos nos alfabetizar.
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* João Alves dos Reis Junior, mais conhecido como JOÃO ALEGRIA é doutor em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, a PUC-Rio, diretor de televisão, comunicólogo, escritor, ex diretor do Canal Futura e, atualmente, Gerente Geral do Laboratório de Educação da Fundação Roberto Marinho (FRM), além de professor do Curso de Design em Mídias Digitais da PUC do Rio de Janeiro. O João está na rede Pluriverso @joao_alegria. Para saber mais do seu trabalho acesse https://www.joao-alegria.com/quem-sou-eu-/