ISSN 2764-8494

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Economia solidária

Por Caroline Oliveira

Cooperativas defendem economia solidária no combate à fome e ao desemprego em evento com Lula – Pedro Stropasolas / Brasil de Fato

A União Nacional das Organizações Cooperativistas Solidárias (Unicopas), formada por aproximadamente duas mil cooperativas de diferentes ramos em todo o país, apresentou a Plataforma de ações estratégicas do cooperativismo solidário, na última quarta-feira (14), em um evento com o ex-presidente e candidato ao Planalto Luiz Inácio Lula da Silva (PT). 

O documento reúne propostas para a construção de um modelo econômico alternativo aos modelos de produção atuais, a partir da economia solidária e do cooperativismo. As lideranças acreditam que somente esses conceitos são ferramentas capazes de solucionar problemas atuais, como o desemprego, a fome a concentração de renda. 

A economia solidária, segundo Daniela Pimentel, supervisora administrativa na Associação do Voluntariado e da Solidariedade (Avesol), é, resumidamente, a organização do trabalho de forma coletiva e igualitária, com prioridade à vida das pessoas e ao meio ambiente, acima do lucro. E a cooperação, por sua vez, é um dos princípios da economia solidária, ao lado de autogestão, democracia, solidariedade, respeito à natureza, comércio justo e consumo solidário.   

Em seu livro Introdução à Economia Solidária, o economista Paul Singer, que criou o termo, afirma que se trata de um “modo de produção cujos princípios básicos são a propriedade coletiva ou associada do capital e o direito à liberdade individual. A aplicação desses princípios une todos os que produzem numa única classe de trabalhadores que são possuidores de capital por igual em cada cooperativa ou sociedade econômica. O resultado natural é a solidariedade e a igualdade, cuja reprodução, no entanto, exige mecanismos estatais de redistribuição solidária da renda”. 

“Na empresa solidária”, por exemplo, “os sócios não recebem salário”, mas o que o autor chama de “retirada”, que varia conforme a receita obtida. “Os sócios decidem coletivamente, em assembleia, se as retiradas devem ser iguais ou diferenciadas”, escreveu Singer. Trata-se de um desenvolvimento econômico atrelado ao desenvolvimento social, com a construção da cidadania a partir do trabalho e da inclusão social. 

Pimentel afirma que um exemplo forte de cooperativas no meio urbano são aquelas formadas por catadores de materiais recicláveis, “que são em sua maioria formadas por mulheres moradoras de religiões de periferia e provedoras dos lares, que encontram, dessa forma, uma prática uma alternativa de renda e inclusão social”, afirma. 

Uma dessas mulheres é Claudete Costa, vice-presidente da Unicopas e presidente da União Nacional dos Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis do Brasil (Unicatadores). Em suas palavras, a economia solidária associada ao cooperativismo forma “uma cadeia que envolve toda uma sociedade, o que significa incluir as pessoas dentro do mercado de trabalho, gerando renda”. 

Contexto de desemprego e fome 

Como disse Paul Singer, a fome não é resultado da falta de comida, mas da falta de dinheiro. Hoje, 33 milhões de pessoas passam fome no país, o mesmo patamar de 30 anos atrás, de acordo com o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, feito pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan). O mesmo estudo mostra que seis a cada dez famílias têm dificuldades para comer. São aproximadamente 125 milhões de brasileiros que não têm a garantia de comer todos os dias. 

É neste mesmo contexto que, no trimestre encerrado em julho, o número de empregados sem carteira no setor privado assinada bateu recorde, chegando a 13,1 milhões de trabalhadores. A quantidade representa um crescimento de 4,8% em relação ao trimestre anterior, encerrado em abril. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 

::Mapa da fome: pesquisa mostra onde estão as pessoas em insegurança alimentar no país::

Para Daniela Pimentel, não se trata de apenas uma crise corriqueira, mas se um sintoma de uma “doença muito maior” que é a crise do capitalismo. Nesse sentido, “a economia solidária é uma prática alternativa a esse sistema vigente, uma solução para esse sintoma que a gente tem hoje”.  

Economia solidária na retomada econômica 

Nessa mesma linha, Tereza Campello, ex-ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, defende que as cooperativas e as organizações de economia solidária “são partes estratégicas da retomada” econômica, a partir da geração de empregos e da produção de alimentos saudáveis para o mercado interno.  

“A maior parte dessas cooperativas são ligadas à própria produção de alimentos. Nós estamos aqui com cooperativas que produzem comida de verdade, sem veneno, agroecológica. Por isso, eles [cooperados] vão ajudar a garantir um aumento da produção de comida de verdade, o que vai ser fundamental nesse processo de combate à fome.” Por isso, é necessário “fortalecer a agricultura familiar, com crédito, assistência técnica, programas de compras públicas, como é o PAA, e retomar os conselhos de participação social”, afirma Campello. 

No evento, lideranças cooperativistas defenderam a construção de um conjunto de políticas e programas que levem em consideração a distribuição de riqueza, a valorização do ser humano e o respeito ao meio ambiente, tendo como base as cooperativas de agricultores familiares.  

Fome se alastra no Brasil: 6 em cada 10 famílias não têm acesso pleno a alimentos

Sandra Nespolo Bergamin, dirigente da União Nacional das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Unicafes), por exemplo, disse que “é somente através da organização em cooperativa” que será possível “conseguir uma nova sociedade, mais justa, mais fraterna e mais inclusiva”.

Para isso, ela afirma que “os agricultores e as agricultoras familiares organizadas nas cooperativas da agricultura familiar e nas cooperativas de economias solidárias do Brasil necessitam de uma proposta diferenciada, e o documento da plataforma traz esse diferencial e retrata esta diferença e a importância de ter políticas públicas que venham de encontro às necessidades das pessoas”. 

Propostas da plataforma

A Plataforma de ações estratégicas do cooperativismo solidário inclui propostas a partir de três pontos principais: crédito para investimento, crédito para capital de giro e organização social. Entre as propostas, estão a criação do Programa Brasil Trabalha, que deve coordenar o processo de “desenvolvimento de estratégias de formação, assessoria técnica e fomento à formação de Cooperativas de Trabalho, como estratégia central, na constituição de portas de saída das políticas sociais e prioridade de contratação em obras e contratos públicos”. 

As cooperativas também propõem a construção do programa Formação Profissional e Cidadã, com vistas à formação de cooperativistas urbanos e rurais em gestão, contabilidade, administração e outros, tendo como público preferencial jovens e mulheres. 

Outra proposta, dentre as que estão descritas em 51 páginas da plataforma, é a constituição de fundos específicos dentro dos fundos constitucionais para as cooperativas solidárias e a criação de um fundo dentro do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para esse atendimento. 

“Nós nos propomos, com essa plataforma, chegar ao governo e pautar a organização da sociedade civil, principalmente no que tange ao desemprego e à fome, para agricultura familiar ser uma grande referência em produção de comida e a organização social no meio urbano para receber essa comida”, afirma Francisco Dal Chiavon, presidente da Unicopas. 

“Nós entendemos que a reestruturação da Conab [Companhia Nacional do Abastecimento] e a viabilidade das políticas públicas, como o PNAE [Programa Nacional de Alimentação Escolar] e o PAA [Programa de Aquisição de Alimentos], são instrumentos importantes para gente avançar organização social e ajudar a resolver esses problemas que nós temos na sociedade.”

As entidades defendem que a “economia solidária só pode atingir seu pleno desenvolvimento com a preservação ambiental e regulação da exploração dos recursos naturais que garantam a sustentabilidade do meio ambiente, e avançando na expansão da reciclagem de materiais feita de forma cooperada”.

Essa matéria foi publicada também em Brasil de Fato.

Possui graduação em Jornalismo pela Universidade Estadual do Centro-Oeste (2008) e mestrado em Desenvolvimento Comunitário pela Universidade Estadual do Centro-Oeste (2015). Atua na área de assessoria de imprensa e marketing em meios digitais.


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